Utilização de probióticos em pisciculturas e pesqueiros



Para preservar a sanidade dos viveiros de cultivo de peixes  são adotadas várias práticas que visam à conservação da qualidade da água. Dentre as principais práticas temos a escolha da densidade de cultivo adequada, o correto manejo alimentar a fim de maximizar o aproveitamento da ração ou do alimento, evitando o aumento da carga orgânica, a manutenção de níveis adequados de oxigênio dissolvido e, sobretudo, a existência de uma microbiota favorável ao equilíbrio do meio de cultivo.
Os microrganismos exercem grande influência em todos os processos bióticos nos ambientes aquáticos, atuando como supridor e consumidor de oxigênio, alimento para organismos maiores, recicladores de nutrientes e podem atuar como patógenos para plantas e animais, quando existe uma condição de desequilíbrio ambiental associado à baixa resistência imunológica dos organismos em questão (estresse). Portanto, a permanência de uma microbiologia adequada repercute em diversos processos bioquímicos vitais para a regulação ambiental, interagindo com o organismo de cultivo, tanto de forma negativa, como no caso das enfermidades, como positiva, como nas interações nutricionais.
            Como exemplo destas condições, reside o fato de que o íon amônio é utilizado como fonte de nitrogênio pelo fitoplâncton e por bactérias heterotróficas, que podem chegar a consumir até 50% do amônio dissolvido na água, o que mostra a importância desses microrganismos para a boa qualidade do meio de cultivo. Outra implicação é a atuação dos microrganismos sob a ração não consumida que pode ser reaproveitada através da formação de grumos ou agregados bacterianos (Floc Bacteria) como alimento para algumas espécies cultivadas, como peixes de hábito alimentar detritívoro e camarões.      
     Uma das medidas para se manter uma microbiota benéfica capaz de controlar a infestação de microrganismos patogênicos, como também de levar às diversas reações de degradação da matéria orgânica sem prejuízo ao meio, é através do uso de probióticos. Gatesoupe (1999) sugere a seguinte definição de probiótico para uso em aqüacultura: Suplemento microbial vivo que possua a capacidade de atuar no ambiente aquático, em processos denominados de Biocontrole e Bioremediação, ou no organismo-alvo com ação probiótica propriamente dita. 
    Os cultivos probióticos podem ser divididos em cultivos que consistem de uma única cepa de bactéria (cultura pura), ou cultivos mistos que contêm duas ou mais espécies. Um fator essencial para o bom funcionamento de probióticos ao meio de cultivo é a necessidade de aplicações constantes durante todo período porque as condições ambientais sofrem mudanças periódicas, conforme o crescimento dos organismos, mudanças na salinidade, temperatura, variações no oxigênio dissolvido, entre outros fatores bióticos e abióticos, com conseqüentes mudanças na microbiota dominante.
     Na escolha do probiótico a ser utilizado deve-se, portanto, considerar a variedade de microrganismos presentes, pois o uso de uma única cepa pode levar a uma reduzida biodiversidade, o que conseqüentemente aumentaria o risco de patógenos oportunistas tomarem o nicho da bactéria probiótica, quando as condições favoráveis a esse microorganismo sofrem mudanças. Zamora et al (2001) utilizaram microrganismos de cultivo misto (EM) na produção de camarão, obtendo um menor custo de produção, menor tempo de cultivo e uso mais racional da água com apenas a reposição das perdas por evaporação.
Douillet (1977) observa que a ecologia microbiana em sistemas de cultivo é complexa e desconhecida e que, dada sua influência e importância no êxito dos cultivos, o manejo microbiológico torna-se uma das alternativas mais promissoras para melhorar os índices de produção, juntamente com a diminuição dos impactos causados pela atividade.


Ø Bactérias produtoras de ácido lático: As bactérias lácticas transformam açúcares produzidos por bactérias fotossintéticas e leveduras em ácido láctico. Em condições anaeróbias, elas decompõem a proteína em aminoácidos. As bactérias lácticas também têm forte capacidade bactericida, em especial, no controle da reprodução de microrganismos nocivos e no controle da rápida decomposição putrefativa da matéria orgânica. Solubilizam a matéria orgânica de difícil decomposição, como a lignina e a celulose, e ao mesmo tempo, eliminam os vários efeitos nocivos causados pela matéria orgânica não decomposta, através de um processo fermentativo.

Ø Leveduras: As leveduras usam a energia fermentativa. Além disso, fazem uso das substâncias secretadas pela raiz das plantas, dos aminoácidos, dos açúcares produzidos pelas bactérias fotossintéticas e da matéria orgânica existente dentro do solo, como matéria-prima. Elas sintetizam as substâncias úteis às plantas e outros microrganismos, em especial, as substâncias bioativas e produzem substratos necessários à reprodução de outros microrganismos eficazes (bactérias lácticas e actinomicetos).

Ø Actinomicetos: O actinomiceto é um microrganismo intermediário entre a bactéria e o fungo. Aproveita aminoácidos produzidos pelas bactérias fotossintéticas e produz substâncias antimicrobianas. Essas substâncias antimicrobianas controlam os microrganismos patogênicos e produzem um ambiente favorável a outros microrganismos úteis. Quando os actinomicetos coexistem com as bactérias fotossintéticas, sua ação purificadora de duplica se comparado ao actinomiceto atuando sozinho.

Ø Fungos filamentosos: Esse grupo em especial é eficaz no aumento de ésteres dentro do solo e tem forte capacidade de formação de álcool e ácidos orgânicos e grande efeito na dissipação do odor.

Ø Bactérias fotossintéticas: As bactérias fotossintéticas presentes no probiótico são microrganismos fototróficos facultativos, denominadas como “não fixadora de enxofre”, que se desenvolvem tanto em condições aeróbias como anaeróbias, usando o metabolismo fermentativo. Com isso, o excesso de nutrientes é retido, evitando a proliferação de espécies invasoras, como as algas e reduz a camada de lodo sedimentada, como também os níveis de amônia. Algumas espécies presentes no probiótico são: Rhodopseudomonas palustris e Rhodobacter sphaeroides.

Algumas propriedades das bactérias fotossintéticas:

·       Permite a quebra da matéria orgânica em compostos mais simples, como açúcares, aminoácidos, ácidos orgânicos etc;
·       Tem habilidade de se propagar em condições aeróbias e anaeróbias, através de diferentes metabolismos (por exemplo, respiração anaeróbia);
·       Ativam bactérias que eliminam o sulfeto de hidrogênio e ácido nítrico como forma de eliminação do enxofre e do nitrogênio. Possui forte capacidade de remover a amônia;
·       São fontes de proteína celular, contendo aminoácidos essenciais, vitaminas e carotenóides, podendo ser importantes na cadeia alimentar aquática.

Quando o probiótico é utilizado de forma correta, havendo a manutenção das populações de bactérias vivas, espera-se uma melhoria das condições ambientais e, conseqüentemente, um menor nível de estresse aos organismos cultivados. Os resultados são:

                  Quando utilizado como biorremediador na melhoria da qualidade de água:

·     Estabilização do pH;
·     Redução do poder residual do lodo acumulado no fundo de tanques e viveiros;
·     Diminuição dos odores provocados pela degradação da matéria orgânica;
·     Redução do excesso de nutrientes causadores do processo de eutrofização em ambientes aquáticos;
·     Redução da DBO/DQO do efluente gerado;
·     Fixação do gás sulfídrico (H2S) em enxofre elementar;
·     Diminuição da turbidez.

          Quando o probiótico é utilizado como probiótico propriamente dito, ou seja, na alimentação dos organismos aquáticos se espera:

·         Ação probiótica, quando fornecidas como suplemento alimentar, pois os microrganismos presentes têm a capacidade de se instalar e proliferar no trato intestinal, com ação de promover o crescimento, beneficiando a saúde do hospedeiro pelo estímulo às propriedades existentes na microbiota natural. Seus modos de ação são: competição por sítios de ligação (exclusão competitiva), produção de substâncias antibacterianas e enzimas, competição por nutrientes e estimulação do sistema imune;
·         Diminuição do consumo de ração em função da melhoria da conversão alimentar;
·         Menor susceptibilidade às doenças e outras enfermidades ou seja, uma forma de prevenção ao não uso de antibióticos.

Na piscicultura, enfermidade significa qualquer alteração adversa na saúde ou no desempenho dos peixes cultivados. As enfermidades são desencadeadas quando ocorre um desequilíbrio entre as condições ambientais do viveiro, o estado de saúde dos peixes e os agentes potencialmente patogênicos. As enfermidades infecciosas são causadas por patógenos transmissíveis (vírus, bactérias, protozoários e fungos), enquanto as não infecciosas são resultantes de agentes abióticos (efeitos nutricionais, genéticos, ambientais e físicos). Sob uma situação de desequilíbrio no ambiente de cultivo, os peixes são submetidos a uma condição de stress, gerando uma alteração em seu estado imunológico. Nestas circunstâncias, a população cultivada pode sofrer um ataque de patógenos levando os indivíduos à debilitação ou morte.
Inúmeros fatores ambientais podem desencadear um processo infeccioso nos peixes. Temperaturas e pH extremos, baixas concentrações de oxigênio dissolvido, mudanças abruptas na salinidade e presença de substâncias tóxicas são elementos associados a um desequilíbrio no ambiente. A propagação de bactérias patogênicas oportunistas (Vibrio spp., Aeromonas spp.), a proliferação de protozoário, a captação de água contaminada, a aquisição de alevinos com deficiências nutricionais ou de baixa qualidade genética  e a presença excessiva de microalgas (dinoflagelados e cianofíceas) também geram efeitos deletérios na saúde dos peixes.
A mais bem sucedida das estratégias para o controle de doenças em fazendas de cultivo combina a prevenção por exclusão (biossegurança) e adoção de práticas saudáveis de manejo. É importante compreender que um único elemento do manejo não protege os estoques contra a reincidência de enfermidades, mas sim a unificação de um plano integrado de manejo para a manutenção de um sistema de cultivo ambientalmente equilibrado. O desenvolvimento de alevinos resistentes a patógenos específicos, o aperfeiçoamento de técnicas rápidas para o diagnóstico de enfermidades em peixes e as inovações tecnológicas das rações balanceadas e probióticos prometem aumentar consideravelmente o estado de saúde dos peixes e a integridade dos cultivos.
Segundo Fuller (1989), probióticos são suplementos alimentares à base de microrganismos vivos que afetam beneficamente o hospedeiro, promovendo o balanço da microbiota intestinal. A microbiota gastrointestinal de peixes, ostras camarões e outros organismos aquáticos são peculiarmente dependente do meio ambiente externo, devido à passagem do fluxo de água através do trato digestivo. Como estes seres são poiquilotérmicos, a microbiota associada deve variar com as mudanças ambientais, tais como temperatura, salinidade, etc. 
Microrganismos gram-negativos facultativos prevalecem no trato digestório de peixes e moluscos, apesar de anaeróbios simbiontes provavelmente serem dominantes no intestino posterior de muitos peixes herbívoros tropicais. Vibrio e Pseudomonas são os gêneros mais encontrados em crustáceos, peixes marinhos e bivalves.
Com o objetivo de induzir o balanço da microbiota intestinal, como uma forma de prevenir que bactérias oportunistas se tornem patogênicas, são utilizadas cepas probióticas, como bactérias gram-positivas produtoras de ácido lático (Lactobacillus casei, L. bulgaricus), Bacillus subtillis, entre outros, em substituição ao uso de antibióticos.
O mecanismo de ação de cepas probióticas em peixes, moluscos e crustáceos ainda é desconhecida, mas espera-se que os mesmos benefícios já estudados em outros animais de interesse econômico possam ocorrer também. Os probióticos agem por exclusão competitiva, aderindo a sítios específicos localizados no epitélio intestinal, diminuindo, dessa maneira, a colonização por microrganismos patogênicos. Algumas formas de atuação são:

- No intestino, os microrganismos do probiótico realizam uma rápida metabolização de substratos (açúcares, vitaminas, aminoácidos, proteínas), tornando-os indisponíveis aos patógenos e, por conseqüência, impedindo a proliferação destes;
- Através da produção de ácido lático, ocorre uma redução no pH intestinal, tornando o meio impróprio para a multiplicação dos agentes patogênicos;
- Secretam proteínas (bacteriocinas) que têm uma ação inibitória ou destrutiva contra uma cepa específica de bactéria;
- As bactérias produtoras de ácido lático podem estimular a produção de anticorpos e a atividade fagocítica contra patógenos no intestino e em outros tecidos do corpo;
- Bactérias benéficas aumentam a atividade enzimática no trato gastrointestinal;
- Aumento na área de absorção do intestino.




Texto original : Francisco Ugayama

Jorge Meneses - Biólogo - Consultoria para pisciculturas e pesqueiros.  

Contato : ( 11 ) 998116744 ( vivo e whatsapp )

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